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Carta Encíclica — Fraternae Communionis

CARTA ENCÍCLICA
FRATERNAE COMMUNIONIS
DE SUA SANTIDADE
PAPA PAULO IV
AOS IRMÃOS CARDEAIS,
ARCEBISPOS, BISPOS,
AOS PRESBÍTEROS E DIÁCONOS,
AOS FIÉIS
DE TODO O ORBE CATÓLICO DO HABBO
SOBRE A FRATERNIDADE NA QUARESMA
E COMO VIVÊ-LA.


INTRODUÇÃO

1. FRATERNAE COMMUNIONIS (COMUNHÃO FRATERNA): pela instituição de um novo mandamento, ao transfigurar sua missão àqueles que escolheu como detentores do dom apostólico (cf. Jo 15,12), Nosso Senhor Jesus Cristo também nos mostra que o amor é a sentimento sublime para a união dos seus irmãos e amigos, que assim permaneceriam no seio amoroso de Deus Pai.

2. Na orbe extra-habbiana, o Santo Padre, o Papa São João XXIII, em sua mensagem ao povo na encíclica Pacem in terris, tão bem nos retratou como a guerra pode ser danosa para o desenvolvimento das comunidades cristãs, mas acrescentou que as pessoas de boa vontade poderiam sanar tal problemática.

3. Com a chegada do tempo da quaresma, onde nos concentramos em preparar um cenário límpido em nossos corações para a acolhida ao cumprimento da promessa do Cristo ressuscitado, vemos os esforços para o cessar desta guerra, que não se limita apenas ao confronto com o irmão, mas também ao conflito interno, ainda mais intensificados.

4. O erro, culminado em pecado, seja atentando a Deus diretamente, ou atentando a um filho de Deus, que não deixa de ser uma forma indireta de afrontar ao Pai, promove esta distância da alma límpida e nos faz menor permanentemente se não buscamos a reconstrução desta limpidez.

5. Ao escrever esta carta encíclica, tenho a pretensão de mostrar que o erro é a naturalidade humana, mas não deve vir separado do perdão de Deus e do irmão, isto se o buscarmos. E para isto, enxergarmos com visão apurada as virtudes cristãs que, ao praticadas, nos moldam de maneira a figurarmos em nós mesmos o formato do filho de Deus que almeja a perfeição aos olhos do Pai celeste.


I PARTE
O PÓ QUE FOMOS, O PÓ QUE SEREMOS

6. O tempo penitencial e piedoso da quaresma inicia-se com a quarta-feira de benção e imposição das cinzas sobre as cabeças cristãs, recordando-nos a nossa natureza física aos olhos de Deus (cf. Gn 3,19).

7. Este simples ato, carrega consigo o sentido de nossa existência perante o veredicto que Deus tem a nos impor. Esta existência, que é ser inicialmente o pó, vem nos mostrar nossa pequenez diante da imensidão do universo, e o pó que recebemos é para que interiorizemos este pensamento de redução e indignidade em nossas mentes.

8. Todavia, mesmo diante desta pequenez e insignificância, em paralelo com a imensidão universal, ainda somos a minúscula porção de pó que é amada por Deus, como bem nos lembra o Papa Francisco em seu sermão catequético.

9. O desafio que nos é proposto pelo Pai é uma vivência onde saiamos deste pó inicial, que é quando nos é concedido o dom da vida, e saibamos seguir a retidão e objetividade dos mandamentos de Deus, prescritos nas sagradas escrituras. Para que, quando voltemos ao pó, não tenhamos vivido uma vida vã, uma vida que se resumiu ao pó, no sentido de que nada acrescentou de benéfico, desde seu princípio até o seu fim.

II PARTE
O ERRO DO HOMEM E A BUSCA PELO PERDÃO DE DEUS

10. Davi, o Rei de Israel, escolhido e ungido por Deus para tomar o trono de Saul, este que já não vivia em comunhão com o Deus dos exércitos, não fora livre do pecado e nem da ganância, que se faz pecado natural entre os homens (cf. 2 Sm 12, 1-15). Pela sua prepotência, cobiçou a mulher de outrem e propiciou a morte deste, utilizando de estratégias ardilosas e que demonstram o mau-caratismo, com olhos vidrados no alcance de um objetivo meramente mundano e que o afastava de Deus. Todavia, arrependeu-se e suplicou o perdão do Pai, que o perdoou, mas o penitenciou.

11. Na passagem do item anterior, Davi abdica de uma relação fraterna com Urias, o heteu, atentando indiretamente contra Deus e seus mandamentos. Nas relações atuais, embora o milenar espaço de espaço de tempo entre a história narrada e a história presente, vemos a constante renúncia pelos preceitos divinos em contraposição à derradeira aderência à autonomia da vontade humana, onde homens e mulheres fazem como Davi e abrem mão da fraternidade com seu irmão, para atingir interesses pessoais.

12. Contudo, o reconhecimento de um erro pecaminoso e o clamor pela misericórdia do Senhor torna-se o único meio de salvação para quem o comete. E a este perdão misericordioso, funde-se a penitência, que não deve ser vista como um castigo, mas uma forma de Deus demonstrar a sua justiça perante seus filhos, ato este que não deixa de ser um outro ângulo para observarmos o amor de Deus por nós.

III PARTE
A MUNDANIDADE E A ARBITRARIEDADE HUMANA

13. Salomão, descendente e sucessor de Davi, no trono de Israel, cedeu aos encantos artificiais do mundo, deixando de lado o culto ao Senhor, teu Deus. Voltou-se contra o Deus que te deu a sua sabedoria, dando mais importância aos prazeres mundanos (cf. 1 Reis 11, 4-13).

14. As influências globais geram um impacto notável nos atos humanos. Apesar de filhos de Deus, também somos filhos da Terra, e é frequente a tentação aos prazeres da Terra por conta de uma arbitrariedade humana desenfreada.

15. Os pecados pela mundanidade, segundo as palavras do Papa Francisco, instalam-se em nossas vidas assim como um câncer, assintomático, sem que notemos. E aos poucos, o costume por esses pecados se fixam no cotidiano, tornando-se um câncer terminal, onde Deus passa a ser esquecido, tomando sua posição o dia-a-dia pecaminoso.

16. Com estes óbices mundanos diários que nos deparamos, cabe a nós o discernimento de escolhermos os atos que tomamos, graças à arbitrariedade que Deus nos concedeu em nossa concepção.

17. O Pai sempre há de nos mostrar mais de uma via para o seguimento de uma etapa de nossas vidas. Todavia, nem todos são iluminados pela luz divina que nos inspira a vivermos as leis do Senhor.

IV PARTE
O RECONHECIMENTO DO IRMÃO
E O AMOR FRATERNO

18. O antigo e o novo testamento nos mostram, em muitas passagens, que a relação dos homens e mulheres, independente de fatores familiares ou intersanguíneos, é a de irmãos. Isto se dá por autonomia divina, visto que somos todos filhos de um único Deus Pai, que por nós olha e derrama bençãos.

19. Laços consanguíneos são superficiais perto de nossos laços espirituais. A necessidade de aflorarmos este amor pelo nosso irmão é cada vez mais necessária, tendo em vista a banalidade com que os homens e mulheres encaram a irmandade em Jesus, fazendo disso meras palavras ditas, porém não praticadas.

20. Em um de seus sermões aos discípulos, Jesus nega-se a elevar sua mãe e seus amigos a um patamar superior aos daqueles que o ouviam (cf. Mt 12, 46-50). Ao fazer isso, o Senhor não busca desvalorizar aqueles que são mais próximos de si, mas reconhece que todos nós fazemos parte de uma família maior, e por isso devemos ser elevados como irmãos: "Pois todo aquele que fizer a vontade de meu Pai que está nos céus, esse é meu irmão, irmã e mãe”.

21. Em um dos trechos do sermão da montanha, Jesus faz antíteses entre as leis dos homens e as leis de Deus. Ao falar sobre a lei do homicídio, o Senhor prioriza que resolvamos os conflitos com nosso irmão, antes mesmo de prestarmos culto ao Pai (cf. Mt 5, 20-26). Novamente, Jesus não busca a desvalorização de um lado, porém busca a valorização do outro, que neste caso é a busca pela verdadeira fraternidade.

22. A vivência em Cristo e na sua Igreja exige que tenhamos uma alma purificada. Se não amamos ao irmão e cultivamos a fraternidade nos corações dos homens e mulheres, não conseguimos esta alma purificada para a adoração correta ao Senhor. Ser cristão é ler, meditar e praticar a sua palavra que incita e ordena a prática do amor fraterno, que é uma das grandes vertentes quaresmais.

V PARTE
AS VIRTUDES CARDEAIS

23. Ao aguardo da Páscoa do Senhor, devemos buscar a perfeição divina, mesmo sabendo que a ela não podemos chegar. Para isto, a doutrina da Igreja nos impõe virtudes, sustentadas por teólogos, dentre eles Santo Agostinho e São Tomás de Aquino, cuja prática nos estimula a buscar à perfeição das leis de Deus: [As virtudes cardeais] são perfeições habituais e estáveis da inteligência e da vontade humanas, que regulam os nossos actos, ordenam as nossas paixões e guiam a nossa conduta segundo a razão e a fé. Adquiridas e reforçadas por actos moralmente bons e repetidos, são purificadas e elevadas pela graça divina [1].

24. A prudência é a virtude da sabedoria. Força-nos ao discernimento do que é certo ou errado, segundo as leis de Deus. Devemos buscar a racionalidade, por meio da fé em Nosso Senhor Jesus Cristo e no que sua palavra nos expressa.

25. A fortaleza é a virtude que assegura a fidelidade ao certo. Os fortes são aqueles que, mesmo com os óbices da vida, onde muitas vezes pensamos em nos corromper para facilitar as coisas, mantêm-se firmes no seguimento das leis de Deus.

26. A justiça é a virtude da análise. Os justos são aqueles que, em observância à vida vivida por cada pessoa, imputam-a aquilo que é merecido, segundo os preceitos divinos.

27. A temperança é a virtude do autocontrole. Como pontuado nos itens 13-17, o mundo nos disponibiliza diversificados prazeres, sendo estes responsáveis pelo distanciamento da boa conduta cristã. Cabe a nós sermos moderadores de nossos prazeres, para que não sejamos consumidos por eles.

28. A vivência das virtudes cardeais nos é essencial nesta quaresma, para que sejamos purificados pela prática de bons atos morais.

VI PARTE
AS VIRTUDES TEOLOGAIS

29. Em consonância com as virtudes cardeais, que surgem para regular os nossos atos e torná-los morais e corretos aos olhos de Deus, segundo a autonomia e racionalidade unicamente humana, as virtudes teologais manifestam-se como a ação do Espírito Santo em nós, fazendo com que vivamos a mansidão e misericórdia necessária na vida cristã: têm como origem, motivo e objecto imediato o próprio Deus. São infundidas no homem com a graça santificante, tornam-nos capazes de viver em relação com a Trindade e fundamentam e animam o agir moral do cristão, vivificando as virtudes humanas. Elas são o penhor da presença e da ação do Espírito Santo nas faculdades do ser humano [2].

30. A fé é a virtude da verdade. Por meio dela, conhecemos, interiorizamos e cremos nos dizeres do Senhor, vivendo a sua verdade, que é única e lecionada pela Igreja de Cristo. Ao sermos fiéis e crentes, nos entregamos por completo a Deus.

31. A esperança é a virtude dos que aguardam. Essa é relacionada com a fé, porque pela crença na verdade absoluta de Deus, nos tornamos esperançosos e aguardamos a cumprimento de sua promessa: a vida eterna no reino celeste do Pai.

32. A caridade é a virtude dos amorosos e empáticos. Essa é a mais importante de todas as virtudes, pois sem praticá-la, não temos cumprindo as outras em sua integridade. Somos chamados a amar ao nosso irmão fraternalmente, interceder pelas necessidades de outrem, assim como Deus faz conosco.

33. A prática destas virtudes são essenciais para a vivência adequada, não apenas da quaresma, mas de todos os momentos do ano litúrgico. Elas nos inspiram a viver com mais intensidade o espírito fraternal que aparece com destaque neste tempo penitencial.

CONCLUSÃO

34. Com base nos itens acima redigidos, a quaresma é um tempo que nos convida a reconhecermos a nossa pequenez perante Deus e o seu universo. Todavia, apesar de pequenos, somos amados imensuravelmente por Deus. Por isso, devemos nos revestir de humildade, admitindo que somos poucos e devemos buscar o mínimo da dignidade de sermos amados pelo Pai.

35. Somos seres falhos, e isto constrói a nossa indignidade. Todavia, aquele que busca o perdão, é perdoado, aquele que ama, é amado, já nos dizia Nosso Senhor (cf. 7, 7-12). Busquemos a misericórdia de Deus, porque Deus abre seu coração a nós, miseráveis, e nos acalenta em seu amor paternal.

36. Com constância, desviamos o foco central da vida, que é nos preparar para a salvação eterna, e nos entregamos às tentações que nos fazem perder o sentido espiritual de nossa existência. A estes prazeres que nos afastam de Deus, renunciemos, e vivamos a oração, penitência e a caridade.

37. Suportai-vos uns aos outros e perdoai-vos mutuamente, toda vez que tiverdes queixa contra outrem. Como o Senhor vos perdoou, assim perdoai também vós. Mas, acima de tudo, revesti-vos da caridade, que é o vínculo da perfeição (Col 3, 13-14). Temos tanta facilidade em ofender, provocar, induzir ao erro aqueles que nos cercam, inclusive nossos familiares, que vivem uma vida inteira em nossa função, mas também temos muita dificuldade em reconciliar nossos laços, em pedir perdão e dar o perdão. Aquela é a mensagem de São Paulo Apóstolo para nós: devemos nos revestir da caridade, que é a fonte do amor fraternal e coração de todas as virtudes.

38. Impulsionados pela alma caridosa e empatia com o irmão, tornemos parte de nós todas as virtudes cristãs, que se fazem unidas pelo amor em Nosso Senhor Jesus Cristo, aquele que nos cura, salva e liberta de todo o mal.

39. Portanto, irmãos e irmãs, ouçamos o chamado do Senhor expresso nesta carta encíclica, na obediência de suas leis, na fraternidade com os amigos e inimigos e na caridade com todos os necessitados e marginalizados. Desta maneira, estaremos cumprindo a ordem do Cristo Jesus, mesmo sabendo que somos incapaz e dignos de cumpri-lá: Sede perfeitos como vosso Pai celeste é perfeito (Mt 5,48).


Dado em Roma, junto a São Pedro, no dia 09 de março no ano da graça do Senhor de 2020.

+ PAULUS Pp. IV
Pontifex et Papam